sexta-feira, 18 de abril de 2025
A PAIXÃO DE CRISTO SOB A ÓTICA JUDAICA: UMA ANÁLISE PROFUNDA
A PAIXÃO DE CRISTO SOB A ÓTICA JUDAICA: UMA ANÁLISE PROFUNDA
Por Paulo Franco,
(Uma abordagem que respeita ambas as tradições, revelando nuances históricas e teológicas)
A visão dos judeus convertidos ao cristianismo (conhecidos como judeus messiânicos ou cristãos de origem judaica) sobre a Paixão de Cristo é profundamente influenciada por sua dupla herança espiritual. Sua interpretação geralmente une elementos da tradição judaica com a fé cristã, criando uma perspectiva única. Aqui está uma análise detalhada:
1. A Paixão como Cumprimento Profético
• Leitura messiânica do Tanach (Antigo Testamento):
• Judeus cristãos veem a Paixão como o cumprimento direto das profecias judaicas, como:
• Salmo 22 ("Transpassaram minhas mãos e meus pés") → Crucifixão.
• Isaías 53 ("Homem de dores, aquinhoado com o sofrimento") → Sofrimento expiatório de Jesus.
• Zacarias 12:10 ("Olharão para Aquele que traspassaram") → Luto por Jesus como Messias.
Comparação com o Pessach:
Muitos veem Jesus como o "Cordeiro Pascal" (Êxodo 12), cujo sangue traz libertação espiritual. A Última Ceia é interpretada como um Seder de Pessach messiânico.
2. A Questão do Sacrifício e Expiação
• Sacrifício único vs. sistema do Templo:
• Enquanto o judaísmo rabínico enfatiza o arrependimento (teshuvá) e, historicamente, os sacrifícios animais, judeus cristãos creem que:
• Jesus cumpriu e substituiu o sistema sacrificial (Hebreus 9-10).
• Seu sangue tem o mesmo significado simbólico que o sangue do cordeiro no Êxodo.
A Visão Judaica Tradicional ortodoxo sobre a Paixão de Cristo
Contexto Histórico
O judaísmo não reconhece Jesus como Messias ou divindade. Os eventos da Paixão são vistos como um relato histórico sobre um judeu do século I que foi executado pelos romanos, sem significado salvífico.
A crucificação era um método romano de execução, não uma prática judaica (o judaísmo antigo praticava o apedrejamento para crimes capitais).
I. AS RAÍZES DO DIVÓRCIO INTERPRETATIVO
1. O Problema Hermenêutico
• Os cristãos leem o Tanach (Antigo Testamento) como prefiguração de Cristo (ex.: Salmo 22, Isaías 53).
• Os judeus leem os mesmos textos como:
• História de Israel (Isaías 53 como metáfora do povo judeu sofrendo entre as nações).
• Promessas messiânicas futuras (um Messias ainda por vir, sem associação com sofrimento expiatório).
2. A Questão do Sacrifício
• Para o cristianismo: "Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" (João 1:29).
• Para o judaísmo:
• O sistema sacrificial do Templo sempre exigiu animais, nunca humanos (Levítico 1:3).
• A expiação ocorria através de arrependimento (teshuvá) + sacrifício animal, nunca por substituição humana.
II. A CRUZ NA HISTÓRIA JUDAICA
1. O Trauma do Antissemitismo
• A acusação de "deicídio" (assassinos de Deus) gerou perseguições por séculos:
• Cruzadas
• Pogroms
• Discursos antissemitas (como os de Martinho Lutero)
• O Vaticano II (1965) rejeitou oficialmente a culpa coletiva dos judeus (Nostra Aetate).
2. Respostas Rabínicas à Paixão
• Maimônides (Rambam)
"Jesus foi um falso messias, mas seu movimento ajudou a espalhar o monoteísmo entre os gentios" (Mishneh Torá, Hilkhot Melachim).
• Rabino Jacob Emden (século XVIII)
"Os ensinamentos morais de Jesus são compatíveis com a Torá, mas sua divindade é idolatria."
III. PERSPECTIVAS CABALÍSTICAS SURPREENDENTES
1. O Zohar e o Sofrimento dos Justos
• Textos místicos falam de tzadikim (justos) que carregam as dores do mundo:
"Quando um justo sofre, é como se o Shekhiná (Presença Divina) estivesse no exílio" (Zohar III, 218a).
• Alguns cabalistas viram paralelos (não cristológicos) entre Jesus e figuras como Rabbi Akiva (martirizado pelos romanos).
2. O Conceito de Mashiach ben Yosef
• Uma tradição obscura fala de um messias sofredor que precede o messias triunfante (Mashiach ben David).
• Nunca associado a divindade ou expiação, mas a um líder militar que morre em batalha.
IV. JESUS NO TALMUD: OS TEXTOS POLÊMICOS
1. A Menção a "Yeshu"
• Sanhedrin 43a descreve a execução de um "Yeshu" na véspera do Pessach:
• Diferenças cruciais: apedrejamento (não crucificação), ocorrência em Lod (não Jerusalém).
• Estudiosos debatem se é Jesus ou outro personagem.
2. O Talmude e a Ressurreição
• Em Sanhedrin 106a, um Yeshu é descrito no Inferno sendo punido com "excremento fervente".
• Interpretação rabínica: Reação ao proselitismo cristão no século II, não necessariamente sobre o Jesus histórico.
V. DIÁLOGO CONTEMPORÂNEO: UMA NOVA LEITURA
1. O Jesus Judeu
• Acadêmicos judeus como Geza Vermes e David Flusser ressaltam:
• Jesus foi um judeu observante que debateu dentro da tradição farisaica.
• Suas parábolas seguem padrões rabínicos (compare com Hillel).
2. O Papa Francisco e o Fim da Teologia da Substituição
• Em 2015, o Vaticano declarou: "A Aliança de Deus com os judeus nunca foi revogada."
• Reconhecimento de que judeus não precisam de Cristo para salvação (Documento "O Dom da Torá").
CONCLUSÃO: DUAS VERDADES, UMA HISTÓRIA
"Dois povos olham para o mesmo homem na cruz:
Uns veem o rosto de Deus.
Outros, um filho de Israel caído.
Mas talvez haja uma terceira visão -
aquela que reconhece
que o sofrimento humano
é sempre sagrado,
e que o Gólgota
é também um espelho
de todas as vítimas da História."
PARA REFLETIR:
• Como conciliar a devoção cristã com o respeito à sensibilidade judaica?
• O que a Paixão ensina sobre como religiões interpretam o sofrimento?
Jesus é o autor e consumador da minha fé! Paulo Franco.
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